terça-feira, 26 de novembro de 2013

Infrator custa R$ 7 mil/mês ao Estado

Governo estadual gasta R$ 316 por mês com cada aluno, 22 vezes menos do que com menor infrator

Em cinco meses recém- completados na Fundação Casa de Ribeirão Preto, Guilherme diz ter recebido mais atenção do Poder Público do que em seus 17 anos de vida. Internado após uma série de roubos à mão armada - e sem completar, sequer, o Ensino Fundamental - ele agora voltou a estudar e deve sair com diploma na área de informática.

Por mês, o Estado gasta R$ 7,1 mil com a recuperação de Guilherme – valor aplicado também em cada um dos outros 9,4 mil internos das 148 unidades da Fundação em São Paulo. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 97% dos ribeirão-pretanos em idade produtiva recebiam salários menores do que essa quantia em 2010.

“Não há dúvidas de que o valor é elevadíssimo”, afirma Júlio Manuel Pires, professor da USP e especialista em economia e políticas públicas. Ele, entretanto, faz a ressalva. “É um custo necessário para esses jovens, mas proporcionalmente muito maior do que o investido em prevenção”, alerta.

Somando as três unidades da Fundação Casa, Ribeirão Preto possui atualmente 359 jovens internados. Em um ano, o Estado gasta com eles R$ 30,5 milhões – praticamente o mesmo da soma dos orçamentos previstos para as secretarias municipais de Cultura (R$ 22 milhões) e Esportes (R$ 11 milhões).

A discrepância persiste no Estado. O governo de São Paulo, responsável por custear a Fundação, reservou R$ 1,1 bilhão para todas as unidades, dez vezes mais do previsto para a Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude.

Especialistas ouvidos pelo A Cidade foram unânimes em afirmar que não se deve diminuir os investimentos na Fundação Casa, mas aumentar as verbas para políticas preventivas, principalmente educação.

Segundo o Ministério da Educação, o investimento no setor no Estado de São Paulo é de R$ 316 por aluno mensalmente, ou seja, 22 vezes menor do que o custeio de uma internação na Fundação.
“Fecha-se os olhos para tentar recuperar os potenciais criminosos já nas escolas e, com isso, a repressão se torna muito maior do que a prevenção”, diz o promotor de Infância e Juventude de Ribeirão Preto, Carlos Alberto Goulart Ferreira, ressaltando que a reincidência no crime desses jovens é grande.

Sem mudanças, o futuro não é otimista. Neste ano, Ribeirão Preto registrou um adolescente apreendido a cada dois dias. “Aonde vamos parar? Eu, sinceramente, não sei”, assume Guilherme Astolfi Caetano Nico, diretor regional da Fundação Casa.

Infográficos/A Cidade

Promotor quer mais escolas em tempo integral
O Estado está muito aquém do que pode fazer por esses jovens”, critica Carlos Alberto Goulart Ferreira, promotor da Vara da Infância e Juventude de Ribeirão, ressaltando que “o adolescente é presa fácil para a criminalidade”.

Levantamento do A Cidade mostra que, de janeiro a setembro, 142 jovens foram apreendidos em Ribeirão Preto, uma média de um a cada dois dias. Em nove meses, eles contabilizaram 383 ocorrências de tráfico, 130 de furto e 91 de roubo.

Goulart cobra a criação de mais escolas em tempo integral e, principalmente, a presença de psicopedagogos para prestar atendimento a alunos problemáticos. Segundo a prefeitura de Ribeirão Preto, apenas três psicopedagogos são responsáveis por todos os alunos da rede municipal.

Para defensor, Estado não cria políticas públicas
A lei não reduz a criminalidade. O que diminui são as políticas públicas”, afirma o defensor público Lucas Marques Trindade, que atua em casos envolvendo jovens de Ribeirão Preto. Por isso, ele diz ser contra a redução da maioridade penal.

Ele explica que os adolescentes infratores vivem em uma “sociedade paralela”, com condições familiares e financeiras precárias. “O jovem pratica o ato infracional por ser o meio mais rápido de proporcionar o acesso a bens que ele não teria a curto prazo”, afirma.

Segundo Lucas, o Estado coloca a culpa nos adolescentes, mas não oferece condições mínimas de acesso a políticas públicas. “E, quando há essa oferta, ela não é divulgada ou incentivada corretamente”, diz.

Jovem ‘cai’ na Fundação por falta de oportunidade
Guilherme Astolfi Caetano Nico é responsável por 18 unidades da Fundação Casa em oito municípios da região de Ribeirão Preto, e traça um perfil dos jovens que estão em recuperação. “Praticamente 90% deles estão aqui por FO: falta de oportunidades”, afirma.

Ele compara a Fundação Casa a uma UTI (Unidade de Tratamento Intensivo): “É o tratamento mais caro e deve ser utilizado somente como última opção”, explica, ressaltando que o Poder Público falha em oferecer os tratamentos preventivos – mais eficazes e baratos.

O diretor aponta a desestruturação da família como uma das consequências para a criminalidade, mas cita a educação como medida principal. “Não se pode mais continuar com o sistema de excluir o aluno que é problemático do sistema escolar, pois isso só o aproxima da criminalidade”, diz.

http://www.jornalacidade.com.br/noticias/cidades/NOT,2,2,902671,Infrator+custa+R+7+mil+mes+ao+Estado.aspx

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