Brasília – Para o Ministério Público Federal, as propostas de
alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) com sanções mais
rígidas para os adolescentes que cometem ato infracional não vão
reduzir a criminalidade. “As experiências com o agravamento de
penalidades têm se mostrado insuficientes para combater a prática de
crimes por adolescentes”, disse o procurador da República, Jefferson
Aparecido Dias, durante um seminário hoje (4) na Câmara dos Deputados,
voltado para o debate sobre as medidas socioeducativas, aplicadas aos
adolescentes que cometem ato infracional (conduta tipificada como crime
no Código Penal).
Dias citou o exemplo da Lei de Crimes Hediondos, que aplica penas
mais severas a crimes como tortura, tráfico de drogas e terrorismo, para
dizer que mesmo após a sanção da lei em 1990, não houve a diminuição
desses tipos de crimes. “Efetivamente não houve redução. Algumas pessoas
dizem que o jovem não é punido e não é verdade. O que elas querem [com a
mudança no ECA] é tornar a situação dos adolescentes pior que a dos
adultos”, disse.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 2011, mostram que
70% dos adultos presos reincidiram na prática de crimes. Enquanto que o
percentual de adolescentes reincidentes, em 2010, segundo o CNJ, ficou
em 12,8%. “É prematuro desistir do ECA porque ele sequer foi aplicado
como se deve e me parece contraditório descartar uma lei sem testá-la”,
argumentou Dias.
O MPF distribuiu uma nota técnica em que se posiciona contra a
redução da maioridade penal e defende a aplicação integral do Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), aprovado em 2012 pela
presidenta Dilma Rousseff. Para o MPF, a internação de adolescentes tem
tido mais caráter punitivo em detrimento do modelo socioeducativo.
“Percebe-se que a lógica da punição sobressai a da educação e
ressocialização do adolescente infrator”, diz um trecho da nota.
Dias destacou que é preciso enfrentar a questão da dependência de
drogas por parte dos adolescentes e oferecer um tratamento adequado aos
adolescentes com transtornos mentais. Dados do CNJ mostram que 80% dos
adolescentes que estão em unidades de internação são usuários de
maconha, cocaína ou crack. “O governo internalizou que a questão da
droga é mais uma questão de saúde pública, mas responde com medidas de
segurança. É uma contradição”, disse.
Segundo o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), o debate visa a dar
subsídios para a Comissão Especial da Câmara que avalia mudanças no ECA.
Mais de dez projetos de lei tramitam no Congresso Nacional com
propostas de mudanças no ECA. O tema é controverso e tem causado
polêmicas.
Entre as propostas estão o Projeto de Lei 7.197/02, do ex-senador
Ademir Andrade, que trata da aplicação das medidas socioeducativas
previstas no ECA a adolescentes que praticaram atos infracionais durante
a infância ou maiores de 18 anos que o fizeram durante a adolescência.
Outra iniciativa, proposta pela deputada Andreia Zito (PSDB-RJ), o
Projeto de Lei 5.454/13, aumenta de três para oito anos o tempo de
reclusão dos adolescentes que cometerem infrações caracterizadas como
crimes hediondos, podendo ficar internados até os 26 anos.
“Estamos ouvindo todos os operadores do direito, as entidades que
cuidam das questões ligadas à criança e ao adolescente com o foco não
apenas na redução da maioridade penal, mas sim na verificação da
necessidade de uma legislação mais efetiva. Isso em relação
principalmente ao que tange ao período de internação para os
adolescentes que praticam ato infracional grave, que hoje é de até três
anos, e alguns cogitam a ampliação desse período para até oito anos, no
caso de crimes hediondos”, disse Sampaio.
Pela manhã, a presidenta do Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente (Conanda), Maria Izabel da Silva, reiterou a
posição contrária ao agravamento das penas. Segundo Maria Izabel, o ECA e
o Sinase definem regras e punições suficientes. “O estatuto já prevê
responsabilização a partir dos 12 anos e é mais duro com crianças e
adolescentes que precisam esperar, reclusos, a sentença do juiz, do que o
Código Penal, que abre possibilidade de adultos aguardarem o julgamento
em liberdade”, disse.
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