quinta-feira, 9 de maio de 2013

Mal vistos, agentes socioeducativos da Funase revelam medos e cobram melhorias

Foto: Fábio Jardelino | NE10 "Não matam a gente porque não querem. É tenso o tempo todo". É com essa certeza que a maioria dos cerca de 1.400 servidores da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase) em Pernambuco convive ao trabalhar com os jovens infratores das diversas unidades de privação de liberdade instaladas no Estado. Segundo relatos de dois Agentes Socioeducativos (ASEs), que preferiram não ser identificados, há uma ameaça frequente à vida dos que atuam nas casas de internação. "Na quadra de futebol do Case de Abreu e Lima (Região Metropolitana do Recife) tem duas barras. Uma eles sempre usam para matar os próprios internos. A outras eles dizem que ainda está virgem, que está reservada para matar uma agente durante uma rebelião", revelou um dos ASEs.

Atualmente, um agente da Funase é contratado para cumprir uma carga horária de 12 por 36 horas. O salário inicial é de R$ 925 para os agentes com contratos temporários, que não podem exceder um máximo de seis anos de serviço. Cerca de 70% do quadro é temporário. Há ainda os que têm contratos permanentes e chegam a receber R$ 2.500 de salário. Os ASEs mais antigos deixam de conviver diretamente com os meninos e passam a cumprir apenas funções administrativas.


Além das más condições de trabalho, como os dois ASEs ouvidos nesse especial denunciam, ele precisam conviver com a permanente desconfiança sobre seus atos. “Aconteceu qualquer coisa, a culpa é dos agentes, às vezes até passa na cabeça de trabalhar errado por causa da falta de reconhecimento”, desabafou o agente que reclama também da falta de interesse do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) quanto às condições de trabalho.
Os profissionais não negam que haja corrupção. Eles confirmam, inclusive, que a maior parte dos produtos proibidos chegam pelas mãos dos próprios ASEs, ou após uma revista intencionalmente falha dos visitantes. “A quantidade de droga e celular que entra nunca vai poder ser só por causa das visitas. Como é que um facão vai entrar? No órgão genital de uma mulher?”
Os funcionários alertam ainda que a maior parte das investigações feitas pelas diretorias das casas, pela Funase ou pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) termina beneficiando os agentes corruptos. “O menor nunca vai denunciar o agente que facilita as coisas pra ele. Pelo contrário, ele inventa acusação para prejudicar o que trabalha certo”, denuncia o ASE. Apesar disso, o diretor-presidente da Funase, Eutácio Borges, disse que 254 servidores do órgão foram exonerados apenas em 2012 por má conduta. Até abril de 2013 esse número já passava dos 80 trabalhadores dispensados.
Questionados sobre os cursos de capacitação prometidos pelo Governo do Estado, através da própria diretoria da Funase, que teriam o objetivo de oferecer mais informações sobre o trato com os jovens infratores, os agentes foram taxativos: “Não tem nenhum curso. Desde 2004 pra cá (tempo de trabalho de um dos ASEs entrevistados) nunca teve curso pra ninguém. O curso é o dia a dia mesmo. Até ter gente que pede pra sair depois de um dia de serviço”, relatou.
Em contrapartida, a direção da Funase garante que em junho deste ano os trabalhadores passarão por um curso de capacitação permanente. O objetivo é fazer com que os agentes deixem de ser apenas vigilantes para serem reeducadores.
Outra reclamação comum é a falta de agentes na maioria das unidades de privação de liberdade. Os ASEs contam que já houve dias em que um único agente ficou responsável por uma ala com mais de 40 jovens. “A lei do Sinase (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo) diz que o certo é ter um agente pra cada três meninos, mas na verdade já teve plantão de ficarem 15 agentes pra tomar conta de mais de 240 menores”, revelou.
O diretor-presidente da Funase, Eutácio Borges, admite o déficit no número de agentes. Segundo ele, Pernambuco conta hoje com um quadro de funcionários cerca de 30% menor do que seria ideal. “Eu tenho unidades com o quadro completo, mas tenho casa com apenas 50% do número ideal”, relatou Eutácio. As unidades com número insuficiente de servidores não foram divulgadas por motivo de segurança.
Para tentar resolver esse problema da falta de agentes, a direção da Funase alega já ter iniciado um processo de contratação: “Nós fizemos seleção pra agentes e assistentes socioeducativos e vamos completar o quadro das unidades do interior do Estado. Também já solicitei uma seleção simplificada para agentes e assistentes nas unidades do Grande Recife e Pacas (nova unidade em Vitória de Santo Antão)”.

http://especiais.ne10.uol.com.br/por_tras_do_muro/internas/agentes.html

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