quinta-feira, 2 de junho de 2016

Unidades para menores infratores estão com o dobro de sua capacidade máxima no Rio

Dois adolescentes dividem a mesma cama no Centro socioeducativo Escola João Luiz Alves, na Ilha Foto: Reprodução


Dois adolescentes dividem a mesma cama na Escola João Luiz Alves, na Ilha

As nove unidades de internação para menores infratores do estado do Rio atingiram o ápice de superlotação nos últimos meses.

Dados obtidos com exclusividade pelo EXTRA revelam que, na primeira semana de abril, havia 2.097 adolescentes internados para 1.051 vagas. Ou seja, o sistema operava com o dobro da capacidade. A situação mais crítica é a do Cense Gelso de Carvalho Amaral, unidade de triagem na Ilha do Governador, onde havia 212 internos e a capacidade é para 64. Pelo local, passam todos os adolescentes que dão entrada no sistema socioeducativo.

A superlotação é reflexo do aumento na quantidade de menores infratores apreendidos. Em dez anos, o número subiu mais de cinco vezes: em 2015, foram 10.262, contra 1.890 em 2006.

— Muitos batem na tecla de que a a superlotação é resultado de internações excessivas, o que não é a visão do Ministério Público. O que há é um número elevado de atos infracionais nos últimos anos, principalmente com violência. Entendemos que a internação é excepcional, mas em alguns casos, inevitável — avalia o promotor Renato Lisboa, subcoordenador de Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude.

Presidente do Sindicato dos Servidores do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Sind-Degase), João Luiz Rodrigues relata que, por conta da situação atual, dois adolescentes precisam dividir uma cama e outros espalham-se em colchões pelo chão. Faltam uniformes e chinelos, e os materiais de higiene e limpeza são fornecidos pelas famílias dos jovens.
— As unidades já são insalubres, assim as condições ficam piores. Difícil falar em ressocialização se o estado não investe o mínimo — pontua.

Educação dos adolescentes comprometida

Membro do Comitê de Prevenção e Combate à Tortura do estado do Rio, Graziela Sereno alerta que a superlotação prejudica o processo de ressocialização dos adolescentes, na medida em que limita o acesso dos adolescentes à escola, cursos profissionalizantes e contato com psicólogos e assistentes sociais.
- A estrutura das unidades é para que haja atendimento daquele número de adolescentes que cada uma suporta. Quando você tem o dobro ou até o triplo, não há estrutura para atender a todos. Uma técnica que deveria atender 20 jovens, precisa atender 60. É impossível - avalia.

O presidente do Sind-Degase concorda:
- A superlotação é o maior dificultador do trabalho dos agentes, que já é difícil e acaba ficando impossível. Além disso, fragiliza a segurança, pois não há agentes suficientes para o número de adolescentes.

Redução não altera lotação
Além das unidades de internação, as de semiliberdade (equivalente ao regime semiaberto) também estão superlotadas. Todas têm a mesma capacidade: 32 adolescentes. Na da Penha, por exemplo, são 88 jovens, em São Gonçalo, 64, e em Santa Cruz, 52. Números divulgados pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) revelam diminuição de 4,7% no número de adolescentes que deram entrada nas unidades para menores infratores nos quatro primeiros meses deste ano (3.761), em relação ao mesmo período do ano passado (3.585). Ainda assim, a queda não trouxe impactos na superlotação do sistema.

Em junho, o Tribunal de Justiça pretende implementar o Núcleo de Audiência de Apresentação dos menores, para que eles sejam apresentados ao MP e judiciário sem passarem por unidades de internação, como ocorre atualmente. A medida promete ajudar a esvaziar as unidades.

Procurado pelo EXTRA, o Departamento de Ações Socioeducativas (Degase) informou que apesar de estar trabalhando muito acima da capacidade, “está garantindo o atendimento a todos os jovens em conflito com a lei que cumprem medidas socioeducativas no departamento servindo cinco refeições diárias e ofertando atividades de cultura, esporte e lazer, além de possuir uma escola estadual dentro de cada unidade de internação”.

Entrevista com a Defensora Pública Eufrásia Souza das Virgens, coordenadora do Cdedica

A superlotação no Degase chegou ao seu pior estágio?
Sem dúvidas. A gente vê isso com um problema muito grave, na medida em que os adolescentes não têm acesso ao básico lá dentro. Falta colchão, vestuário, a alimentação está prejudicada. Ao invés de ressocializá-los, o estado está violando os direitos desses adolescentes.

Quais providências estão sendo tomadas pela Defensoria Pública?
Nessa situação, a legislação prevê que em casos sem violência e grave ameaça, os adolescentes sejam colocados em meio aberto. É isso que a Defensoria está buscando, além de limitar novas internações nas unidades.


http://extra.globo.com/casos-de-policia/unidades-para-menores-infratores-estao-com-dobro-de-sua-capacidade-maxima-no-rio-rv1-1-19348382.html


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