sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Adolescentes aguardam por vagas em cadeias

A superlotação não é só uma realidade das penitenciárias do Estado, mas também das unidades da Fundação Casa, que recebem adolescentes que cometeram alguma infração.

Por conta disso, essas pessoas menores de 18 anos acabam tendo que passar dias e noites em cadeias públicas ou celas existentes em delegacias, esperando por vagas nos locais que são responsáveis por promover a ressocialização desses cometedores de delitos. 

De acordo com a promotora da Vara da Infância e Juventude de Sorocaba, Ana Alice Mascarenhas Marques, a demanda das unidades da Fundação Casa está crescendo ano a ano, porém ela destaca que não estão sendo feitos investimentos para supri-la. Esse fato chamou a atenção na terça-feira, quando três adolescentes apreendidos em uma operação da Polícia Civil em Pilar do Sul, no combate ao tráfico de drogas, foram encaminhados a celas do Plantão Policial Sul de Sorocaba, uma vez que a Fundação Casa 4 - que é a porta de entrada para jovens apreendidos pela polícia - estava sem vagas.

Depois de terem sido apreendidos pela polícia, os adolescentes foram levados à unidade 4 da Fundação Casa. Porém, por conta de uma liminar emitida pela Justiça, expedida depois de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público (MP) do Estado, o local estaria proibido de receber mais adolescentes, caso já tivesse ultrapassado 15% além de sua capacidade - a capacidade é para 24 adolescentes, portanto poderia chegar, no máximo, a 27. Atualmente, a unidade está com 30, conforme relatou o diretor do local, Francisco Alves Pinto, na terça-feira, ao jornal Cruzeiro do Sul.

De acordo com a juíza Karina Jemengovac Perez, do Fórum de Pilar do Sul, somente a adolescente que estava com um bebê de 40 dias, apreendida na operação de terça-feira, que conseguiu, até a tarde de ontem, uma vaga numa unidade da Fundação Casa na Mooca, em São Paulo. Os outros três ainda se encontravam instalados em celas na delegacia de Pilar do Sul. Segundo um ofício encaminhado pela instituição à juíza, todas as unidades que poderiam recebê-los estavam com 15% além de sua capacidade de superlotação.

O delegado seccional de Sorocaba, Marcelo Carriel, afirma que não é raro acontecerem situações como essa em Sorocaba. "Toda a vez que existe essa situação de menores apreendidos na subregião, há esse problema. Ontem foram quatro, então o problema foi mais complicado", revela. Ele lembra que os adolescentes podem ficar em cadeias públicas e celas de delegacias - como as de Sorocaba, São Roque e Pilar do Sul, por exemplo - num período de até 5 dias, conforme previsto no artigo 185 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), caso não haja vagas nas unidades de ressocialização. "Não adianta eles ficarem em unidade policial, em que não temos e não temos que ter, legalmente, local para custodiar. Não temos como proporcionar banho de sol, alimentação adequada e higiene mínima. É uma situação bem delicada", diz.

 Em todo o Estado

 A promotora de Infância e Juventude de Sorocaba, Ana Alice, relata que essas situações se repetem em todo o Estado, por conta das superlotações nas unidades da Fundação Casa. Foi ela, inclusive, quem instaurou a ação civil pública, exigindo que a unidade 4 do centro de ressocialização de adolescentes infratores não aceitasse mais internos além de sua capacidade. Uma ação semelhante também foi proposta pelo MP na capital, em agosto, por conta de superlotação em 106 das 116 unidades. A promotoria da Infância e Juventude pede que a Justiça obrigue a Fundação - ligada ao governo do Estado - a criar em seis meses 1.598 vagas para atender ao déficit de atendimento.

Segundo a promotora, as unidades da Fundação Casa de Sorocaba atendem cerca de 40 municípios, por isso declara que a demanda tem sido bastante grande, fazendo com que ocorram as superlotações. Em visitas aos centros de ressocialização de jovens de Sorocaba, no início deste ano, Ana Alice percebeu o prejuízo que as vagas excedidas vinham causando ao atendimento dos adolescentes internados, por isso propôs a ação, acatada pela Justiça. "Como não está entrando mais e não tem vagas nas outras unidades, esses municípios são obrigados a manter adolescentes em delegacias. Tem muitos juízes liberando os adolescentes, porque não conseguem vaga, por isso eles não ficam aguardando julgamento apreendidos", declara. "Ou seja, a demanda está aumentado, isso é nítido, e esses adolescentes vão continuar sendo submetidos à superlotação ou aguardando em delegacias. Está complicado, porque ninguém quer fazer o investimento que a área precisa", complementa. A juíza de Pilar do Sul possui a mesma opinião. "Acredito que o que deveria ser feito era construir mais unidades em todo o Estado."

http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia/570958/adolescentes-aguardam-por-vagas-em-cadeias


Instituição não sabe quantos aguardam vaga

A Fundação Casa foi questionada sobre o número de adolescentes que acabam tendo de ficar em cadeias públicas e celas em delegacias, pela falta de vagas em suas unidades.

Porém, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que não possui esse dado. Em nota, relatou que quando um adolescente é apreendido, a prioridade seria disponibilizar uma vaga em até 24h após a solicitação do Poder Judiciário, no centro socioeducativo mais próximo do local de origem do jovem, conforme prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Porém, na impossibilidade, o jovem é encaminhado para atendimento na capital paulista. A instituição também lembrou do artigo 185 do ECA, que autoriza a estadia do adolescente em "seção isolada dos adultos e com instalações apropriadas, não podendo ultrapassar o prazo máximo de cinco dias", caso não haja como enviá-lo prontamente a uma unidade da Fundação Casa.

Sobre a excedência da capacidade de suas unidades, a Fundação Casa declara que possui uma autorização do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), confirmada liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal, para que seus centros de atendimento excedam sua capacidade em até 15%. Afirma ainda que esta autorização hoje está contida nas Normas da Corregedoria do TJ-SP.

Para tentar reverter essa situação da falta de vagas, a Fundação Casa declara que entre 2006 e 2014, criou 3.889 vagas para adolescentes com a inauguração de 69 centros socioeducativos. "Atualmente, seis novos centros estão em obras - cinco deles serão entregues ainda este ano. A previsão é de que 500 novas vagas sejam criadas, sendo 260 até o fim deste ano", ressalta.

Especificamente sobre o caso dos quatro adolescentes apreendidos em Pilar do Sul e que tiveram de ficar em celas do Plantão Policial Sul de Sorocaba, a Fundação Casa comenta que nos casos de tráfico de drogas, "por não haver violência ou grave ameaça a pessoa, os jovens devem receber medidas mais brandas, não havendo necessidade, portanto, de anterior internação provisória". "O excesso de aplicação de internação provisória e internação por tráfico tem gerado uma dificuldade momentânea de concessão de vagas pela Fundação em algumas regiões, sendo que, na ausência delas, o adolescente é encaminhado para atendimento na capital paulista", complementa a nota. (A.M.)

http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia/570961/instituicao-nao-sabe-quantos-aguardam-vaga

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