sexta-feira, 27 de junho de 2014

A cada dia, dez menores são apreendidos na região de Ribeirão

A cada mês, uma média de 300 adolescentes são apreendidos em flagrante ou por mandado

Weber Sian / A Cidade
Maria (nome fictício), cujo filho está na Fundação Casa há duas semanas; ele é um dos 5 mil menores que foram apreendidos nos últimos 17 meses pela prática de algum delito (Foto: Weber Sian / A Cidade)

A mãe vive um dilema doloroso, entre a liberdade e a segurança do filho adolescente. Há 13 dias, o menino cumpre *medida socioeducativa na Fundação Casa por roubo. Maria (nome fictício), ao mesmo tempo, teme e quer que ele volte para casa. O relato da vítima é tão doído quanto esse dilema de mãe. “Perdeu, perdeu”, anunciou o filho de Maria, aos 14 anos, com a arma apontada para a cabeça da mulher.

A moto virou coisa pouca perto do medo da morte. O menino virou gigante por tanta violência. “Quando eu vi o primeiro menino na rua, pensei que era uma criança. Depois, o maior apareceu e apontou a arma para minha cabeça”, a vítima conta.

Além do filho de Maria (nome fictício), que, ela diz, “é grande, tem corpo de rapaz”, um menino de 13 anos participou do crime. Os dois foram aprendidos. O problema, porém, tanto a mãe quanto a vítima concordam, vai muito além de um roubo.

O filho de Maria é um entre dez adolescentes apreendidos por dia na região de Ribeirão Preto. De acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública, nos últimos 17 meses, 5.053 adolescentes foram apreendidos em flagrante ou por mandado no Deinter 3 (Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior), por crimes diversos.

Balanço divulgado pela Fundação Casa no início deste ano mostra que cerca de 80% dos jovens cumprem medida socioeducativa por roubo ou tráfico.

Bem por isso, Maria teme que o filho volte para casa. “Eu quero que ele saia, mas tenho medo de sair pior. Peço a Deus que os pensamentos dele lá sejam bons. Que ele possa parar e refletir”.

A mãe diz que deu ao filho a mesma educação que recebeu do pai. As diferenças, ela critica, foram impostas pela sociedade. “Educação eu dei. Hoje o adolescente não pode trabalhar, não pode levar uma palmada. Eu preciso trabalhar e não sei o que ele faz quando está desocupado”, desabafa.

Maria é doméstica e cuida do filho sozinha. O armário do menino, ela garante, guarda mais de um tênis.

“Eu sempre me desdobrei. Se falar que ele está assim por falta de carinho, roupa, sapato, comida, está mentindo”.

O filho chegou a morar um tempo com o pai, mas a mãe se preocupou com suas mudanças de comportamento. “Trouxe ele de volta”, conta. Até onde ela sabe, o menino não usa drogas. Parou de estudar e, há alguns meses, foi apreendido tentando furtar uma joalheria na cidade onde mora, na região de Ribeirão. “Ele negou que estava envolvido’, a mãe diz.

10.nov.2010 - F.L.Piton / A Cidade
Promotor Luis Henrique Paccagnella diz que é preciso
investir em serviços comunitários
(Foto: 10.nov.2010 - F.L.Piton / A Cidade)
A tentativa de roubo da moto acabou admitindo. “Disse que não sabia porque tinha feito aquilo”, revela. 

Neste sábado (28), Maria vai visitar o filho pela primeira vez desde a apreensão. Tem medo do que vai encontrar. “O único refúgio é Deus. Só ele pode ajudar. Eu não sei mais o que fazer”.

Vítima pensou que assaltante era uma criança

Ana, 19 anos, nome fictício, estava indo para a casa do noivo quando foi vítima do filho de Maria e do outro adolescente, há duas semanas. Enquanto o menino de 13 anos, que tem estatura menor, chamou a atenção da moça, no meio da avenida Presidente Kenedy, o outro colocou a arma na cabeça dela. 

“Eu nem vi que o maior estava com a arma, porque achei que o pequeno era uma criança”, ela conta. Com a arma apontada para a jovem, os dois pediam que ela deixasse a moto. “Eles me deixaram lá no meio e eu tive que pedir ajuda para uma pessoa que passava por ali”, ela contou.

Ana está bem. Recuperou a moto e não se feriu.

Adolescentes, porém, tiveram participação confirmada em três latrocínios (roubo seguido de morte) dos quatro registrados este ano em Ribeirão Preto.

Um dos casos mais emblemáticos foi o de Sophie Forti. Um adolescente e seu pai roubaram o carro envolvido no acidente que matou a bebê, seu pai e sua mãe em abril deste ano.

O adolescente foi apreendido pela Diju (Delegacia da Infância e Juventude) de Ribeirão Preto.

Análise>>>‘Investimento está na contramão’

Para diminuir o número de adolescentes apreendidos é necessário maior investimento em serviços comunitários, liberdade assistida, meio aberto. Estamos na contramão: investindo muito em medidas de internação e deixando de prestar serviços à comunidade, com orientação das famílias. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, por exemplo, está regulamentado, mas não funciona. Estado e União deveriam monitorar os municípios. Se essa rede de assistência funcionasse, poderíamos ter resultados positivos na violência. A redução da maioridade penal não funciona. Basta que se observe o sistema penal dos adultos. Eu acredito que o prazo das internações precisa ser revisto, principalmente em crimes graves. O tempo de internação deveria ser mais longo, mas também precisamos fazer o modelo de internação funcionar - Luis Henrique Paccagnella, promotor da Infância e Juventude

*pena

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