segunda-feira, 22 de abril de 2013

Jovens infratores ficam sem cela

Enquanto a sociedade discute a polêmica da maioridade penal, Bauru está, desde a semana retrasada, sem uma cela especial para adolescentes infratores. Agora, todos os apreendidos na cidade são encaminhados para a Cadeia Pública de Avaí, que conta somente com quatro vagas. Após “o leite derramado”, a prefeitura corre atrás de um imóvel para tentar resolver a pendência.
Neide Carlos
Na antiga sede da Diju, desocupada no último dia 8, havia uma cela especial com oito vagas para adolescentes
A “extinção”, cuja possibilidade já havia sido aventada pelo JC em fevereiro, ocorreu após a Delegacia da Infância e Juventude (Diju) migrar para a Central de Polícia Judiciária (CPJ) -  “superdelegacia” da Polícia Civil -, no último dia 8. No prédio antigo, havia uma cela, com oito vagas, para o atendimento inicial após a apreensão do adolescente.

Com a mudança, o contrato de locação com o antigo imóvel da Diju foi finalizado. Como a cela especial não estava prevista na nova sede da Polícia Civil, ela simplesmente deixou de existir.

Tal cela é onde se realiza o chamado Centro de Atendimento Inicial e Internação Provisória (Caip, antigo NAI). Lá, os adolescentes infratores ficam, no máximo, cinco dias. Depois desse tempo, ou são liberados ou são enviados para a Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Casa, antiga Febem).

“É um retrocesso. Quando comecei em Bauru, há 15 anos, os adolescentes iam para a cadeia pública. Essa cela especial que deixou de existir agora foi uma conquista importante”, pondera o juiz Ubirajara Maintinguer, da Vara da Infância e Juventude.

Sem a cela em Bauru, os adolescentes passaram a ser encaminhados para a Cadeia Pública de Avaí. “Eles ficavam em duas celas lá. Mas eu interditei uma delas, justamente porque não ficavam isolados dos outros presos”, relata o juiz.

Agora, há apenas uma única cela na cidade vizinha, com capacidade de quatro vagas, para suprir toda a demanda. Conforme matéria publicada há dois meses pelo JC, fica claro que a quantidade não é suficiente. Na ocasião, as autoridades revelaram que nem as oito vagas existentes na cela especial davam conta de apreender o total de adolescentes envolvidos em crimes.


‘Fio da navalha’

“Estou tenso com essa situação”. A frase do delegado seccional de Bauru, Marcos Mourão, revela o quão problemática é a falta de uma cela especial para adolescentes na cidade. “Estamos realmente no fio da navalha”, complementa.

Mourão afirma que também foi pego de surpresa com a extinção do NAI em Bauru. “A conversa era de que o prédio da Diju continuaria alugado e funcionando como o NAI. É um impasse que nos pegou de surpresa”.

Por sorte, até agora, o número de adolescentes apreendidos não superou a capacidade da Cadeia Pública de Avaí. “Não ocorreu ainda, mas é muito fácil isso (ter mais adolescentes apreendidos do que a capacidade) ocorrer. Eu vou ter que me virar e dar um jeito quando isso acontecer”, relata o seccional, demonstrando o quanto a situação preocupa.

Enquanto o impasse não é decidido, Marcos Mourão revela que já estuda até a possibilidade de ampliar a unidade de Avaí para tentar amenizar a questão. “Estamos estudando uma reforma para ampliar a capacidade da Cadeia de Avaí”, conclui o delegado.

Situação pior na região
Se as quatro vagas na Cadeia Pública de Avaí não são suficientes para suprir a demanda da criminalidade juvenil bauruense, a situação é ainda mais preocupante nos municípios vizinhos a Bauru. O delegado seccional Marcos Mourão revela que eles estão sem alternativa.

“Quando soubemos que o NAI não ficaria no prédio da Diju, o doutor (Benedito Antônio) Valencise (diretor do Departamento de Polícia Judiciária do Interior 4) e eu fomos até Avaí e assinamos um termo para que a unidade apreendesse os adolescentes da Comarca de Bauru”, conta.

Assim, os inúmeros municípios vizinhos, como Agudos, Lençóis Paulista e Pederneiras, não foram abrangidos nesse acordo. “Lá, em Avaí, realmente só são recebidos os adolescentes de Bauru. A Delegacia Seccional de Marília está dando um apoio e estamos mandando alguns para a Cadeia Pública de Garça. A situação realmente nos preocupa bastante”, finaliza, em tom crítico.
Exceção virou regra
Em reportagem veiculada no dia 14 de fevereiro deste ano, a problemática das unidades prisionais para adolescentes em Bauru e região já havia sido exposta pelo JC. Na ocasião, o tráfico foi apontado como o principal fator que injetava os jovens no mundo do crime.

A reportagem também trazia que as oito vagas disponibilizadas na cela da Diju já não eram suficientes para suprir a demanda. Por isso, em algumas vezes, já era preciso mandar os adolescentes infratores para a Cadeia de Avaí. Agora, a situação piorou bastante. Com a extinção da cela especial bauruense, essa exceção virou regra.
Prefeitura procura um imóvel para reinstalar NAI em Bauru
Agora, com a situação no “fio da navalha” e já com a cela desativada, o município corre atrás de um imóvel para oferecer o atendimento inicial ao adolescente infrator. O problema é que, enquanto a procura continua, eles vão ser mandados para fora da cidade.

A ideia do município, conforme o próprio prefeito Rodrigo Agostinho revelou ao JC em fevereiro, era utilizar o imóvel em que funcionava a antiga Diju para instalar o NAI.

Porém, segundo a assessoria de comunicação da prefeitura, a Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan) barrou o prédio por questão de acessibilidade. A justificativa é de que seria necessária ampla reforma no valor de R$ 190 mil para adequar o prédio. Além de tudo, o imóvel continuaria sendo alugado pela prefeitura.

Com isso, a Secretaria Municipal do Bem-Estar Social (Sebes) está atrás de um novo lugar para a instalação do serviço de atendimento inicial aos adolescentes infratores. “Já vimos três imóveis. As equipes estão analisando qual será mais viável”, afirma a titular da pasta, Darlene Tendolo.

Depois de escolhido o imóvel, será proposta uma parceria com a Fundação Casa para a instalação do NAI nesse local. A prefeitura arcaria com a locação do imóvel e a instituição ficaria responsável pela disponibilização de funcionários e manutenção dos serviços.

Apesar de reconhecer que é extremamente importante esse serviço de atendimento inicial aos adolescentes para conter a criminalidade, Darlene Tendolo não emite prazos para que a pendência seja resolvida. “Estamos caminhando rapidamente. Mas, depois que definirmos o imóvel, teremos que nos reunir com o juiz e definir todos os outros pontos, como a instalação e parceria com a Fundação Casa”, aponta a titular da pasta.

http://www.jcnet.com.br/Geral/2013/04/jovens-infratores-ficam-sem-cela.html

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