sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Médico reúne voluntários para ensinar ioga na Fundação Casa

Em 2004, o médico César Deveza perdeu um paciente adolescente. O jovem foi assassinado por dois menores durante um assalto. A relação de amizade que tinha com o garoto o faz pensar de que forma a tragédia poderia ter sido evitada. Praticante de ioga há 40 anos, ele procurou a direção da antiga Febem, atual Fundação Casa, com um projeto simples: queria dar aula de ioga aos internos.
Deveza durante a aula de Yoga na Fundação Casa (Foto: Lívia Machado/G1)


O projeto Yam começou individual, e hoje tem 40 colaboradores. Deveza não fundou uma organização não-governamental (ONG), mas formou ao longo dos nove anos de atuação professores de ioga dispostos a ensinar a técnica aos jovens detidos.
Na primeira aula, lembra que recebeu a autorização para entrar na unidade Adoniram Barbosa, uma das mais violentas da época. “Tinha rebelião quase todo dia. A Tropa de Choque da polícia ficava na porta.” Quando entrou, foi recebido por 160 jovens dispostos a entender o que ele fazia ali. O diretor da unidade disse que não teria como oferecer proteção. “Ele me falou que de uma determinada porta para dentro, não garantiria minha segurança. Já tinha ido até lá, entrei.”
Descobri o meu papel na vida. Em nenhum momento tenho desânimo"
César Deveza, médico

Após a primeira aula, um dos meninos levantou, e deu um abraço no médico, sem falar nenhuma palavra. "Ali descobri o meu papel na vida. Em nenhum momento tenho desânimo.” Segundo o médico, a relação com os meninos sempre foi amistosa. Nunca sofreu nenhum tipo de ameaça. As aulas são bem recebidas pela maior parte dos internos. Quem gosta dos ensinamentos, acaba fazendo propaganda e estimulando outros a participar.
Antes de dar inicio aos trabalhos, Deveza estudou durante seis meses uma técnica que atendesse ao público da instituição. Os professores que se voluntariam também são capacitados por três meses. “Não é uma população comum. O adolescente, em função dos hormônios, transição pra vida adulta, já é uma população diferente. E esses meninos têm uma maturidade diferenciada em função do sofrimento.”
Junior tem 18 anos e está na Fundação há um ano e 19 dias. Participa das aulas há quatro meses. Revela que no começo, tinha vergonha de participar. "Achava que era coisa de macumba". Hoje, quando está nervoso, enconsta em um canto e começa a fazer os exercícios de respiração ensinados por Deveza. "Eu era agressivo. Roubei muito, usei droga. Agora vejo que aprendo muita coisa. A ioga ajuda a relaxar a mente, ficar calmo."
Alunos realizam exercício de relaxamento e respiração durante a aula de yoga  (Foto: Lívia Machado/G1)Alunos realizam exercício de relaxamento e respiração durante a aula de ioga (Foto: Lívia Machado/G1)
Junto com o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e o Instituto do Coração, ele deve publicar, ainda este ano, um estudo que quantifica os efeitos da ioga nos internos da Fundação Casa. Deveza aplicou um questionário nos meninos das unidades do complexo da Vila Maria, na Zona Norte da cidade, onde atua, antes deles começarem a praticar, três e seis meses depois da primeira aula. “Os resultados preliminares são muito positivos. Em qualidade de vida, questionário de sono, ansiedade e depressão. Todos os índices melhoram", antecipa.
O professor também tenta estimular a iniciativa privada a oferecer empregos aos rapazes que deixam a Fundação. É a forma mais eficaz de conter a recidiva. “Muitos querem mudar de vida, mas quando não encontram oportunidade, e voltam pro crime. Eles são inteligentíssimos, para sobreviver nesse meio é necessário. Já fizemos testes psicológicos em vários, e vemos um QI acima da média. Mas eles não têm a tal da oportunidade.”

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/01/medico-reune-voluntarios-para-ensinar-ioga-na-fundacao-casa.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário